segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Bonecas Karajá: Patrimônio Cultural Brasileiro

Além de uma referência cultural nas aldeias indígenas, as Bonecas Karajá representam, muitas vezes, a única fonte de renda das famílias.

Fonte: Iphan/GO

O Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural aprovou, na última quarta-feira, dia 25 de janeiro, o Ofício e os Modos de Fazer as Bonecas Karajá como Patrimônio Cultural do Brasil. A proposta foi apresentada ao Iphan pelas lideranças indígenas das aldeias Buridina e Bdè-Burè, localizadas em Aruanã, Goiás - GO, e das aldeias Santa Isabel do Morro, Watau e Werebia, localizadas na Ilha do Bananal, Tocantins - TO, com anuência de membros das aldeias Buridina, Bdè-Burè e Santa Isabel do Morro. O presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan, Luiz Fernando de Almeida, comemorou o registro ressaltando o trabalho do Iphan de ampliar o número de bens protegidos em todo o país e de alterar a interpretação do que é patrimônio cultural. Para ele, o registro do Ofício e dos Modos de Fazer as Bonecas Karajá “representa uma dimensão de reconhecimento como patrimônio a cultura de comunidades indígenas, como o povo Karajá, ainda pouco conhecida, mas que é fundamental dentro do processo de formação do nós somos, do povo brasileiro”. A coordenadora da Secretaria de Cultura Indígena, da Secretaria de Cultura do Estado de Tocantins, Narubia Karajá, acompanhou a reunião em Brasília e, muito emocionada, declarou aos conselheiros que “este é um momento histórico para nós porque os senhores estão dizendo que nós (o povo Karajá) somos importantes para o Brasil”.


O projeto Bonecas Karajá: Arte, Memória e Identidade Indígena no Araguaia, iniciado em 2009, vem sendo supervisionado pelo Departamento de Patrimônio Imaterial – DPI/Iphan e coordenado pela Superintendência do Iphan em Goiás, que privilegiou o estudo dos aspectos imateriais das bonecas Karajá. As pesquisas para identificar e documentar o ofício, os modos de fazer e as formas de expressão que envolvem a produção das Bonecas Karajá foram realizadas com a comunidade nas aleias karajá Buridina Mahãdu e Bdé-Buré, em Aruanã - GO, e da aldeia de Santa Isabel do Morro, ou Hawalò Mahãdu, na Ilha do Bananal - TO. Durante o trabalho de quase dois anos, foram identificadas as matérias-primas, técnicas e etapas de confecção, além dos mitos e histórias narradas pelos Karajá que expressam a rica relação entre seu povo e o rio, a fauna e a flora, as relações sociais e familiares e a organização social. Toda essa complexidade cultural pode ser identificada nas cenas esculpidas em barro e ornadas com precisos traços em preto e vermelho das bonecas.

De acordo com o Departamento de Patrimônio Imaterial – DPI/Iphan, o Ofício e os Modos de Fazer as Bonecas Karajá são uma referência cultural significativa para o povo Karajá e representam, muitas vezes, a única ou a mais importante fonte de renda das famílias. A confecção das figuras de cerâmicas – chamadas na língua nativa de ritxòkò (na fala feminina) e ritxòò (na fala masculina) – envolve técnicas tradicionais transmitidas de geração a geração. A atividade exclusiva das mulheres é desenvolvida com o uso de três matérias-primas básicas: a argila ou o barro – suù; a cinza, que funciona como antiplástico; e a água, que umedece a mistura do barro com a cinza.

Em regra geral, o modo de fazer ritxòkò segue cinco etapas: extração e preparação do barro, modelagem das figuras, queima e pintura, tudo isso envolvendo um repertório de saberes que se inicia na seleção e coleta do barro até a pintura e decoração das cerâmicas, que estão associadas à pintura corporal dos Karajá e a peças de vestuário e adorno tradicionais. Ao indicar gênero, idade e estatuto social, a pintura e os adereços complementam a representação figurativa das bonecas, que identificam o Karajá homem ou mulher, jovem ou velho, solteiro ou casado, com todos os atributos que a cultura cria para distinguir convencionalmente essas categorias.

As bonecas Karajá e a expressão de uma identidade

Mais do que objetos meramente lúdicos, as ritxòkò são consideradas representações culturais que comportam significados sociais profundos, reproduzindo o ordenamento sociocultural e familiar dos Karajá. Com motivos mitológicos, de rituais, da vida cotidiana e da fauna, as bonecas karajá são importantes instrumentos de socialização das crianças que se vêem nesses objetos e aprendem a ser Karajá. Enquanto brincam com as bonecas ou observam a sua feitura, as meninas recebem importantes ensinamentos e aprendem também as técnicas e saberes associados à sua confecção e usos. Por representarem cenas do cotidiano e dos ciclos rituais, elas portam e articulam sistemas de significação da cultura Karajá e, dessa forma, são também lócus de produção e comunicação dos seus valores.

O processo criativo de produção das ritxòkò ocorre por meio de um jogo de elaboração e variação de formas e conteúdos determinado por uma série de fatores, como a experiência, a habilidade técnica e a preferência estética da ceramista pela combinação dos motivos temáticos e dos diversos padrões de grafismo aplicados. Também expressa a função do objeto, o acesso às matérias-primas e a disponibilidade de recursos financeiros para compra de materiais. Desta forma, as bonecas Karajá condensam e expressam importantes aspectos da identidade do grupo, além de simbolizar diversos planos de sua sociocosmologia.

Atualmente, as bonecas Karajá integram o acervo de vários museus no país, são procuradas como objetos de decoração e comercializadas junto a turistas e lojas de artesanato locais, regionais e nacionais. Entretanto, devem ser compreendidas além da sua expressão material, visto que, desde a sua confecção, desempenham um papel importante na reprodução cultural do povo Karajá. Desta forma, o DPI/Iphan pede a inscrição do Ofício e dos Modos de Fazer as Bonecas Karajá no Livro dos Saberes e, ainda, a inscrição das Ritxòkò - Bonecas Karajá no Livro das Formas de Expressão, como patrimônio cultural brasileiro. O objetivo é estimular a sua produção entre as mulheres Karajá, possibilitando o crescimento das condições de autonomia das ceramistas frente às demandas externas e, ainda, fortalecer os mecanismos de reafirmação da identidade Karajá.

Um comentário:

  1. portaldopatrimonioculturaldopara13 de maio de 2012 às 10:35

    Este blog nos apresenta agora outro olhar sobre o indígena e sua cultura, onde apresenta aspectos marcantes de seu patrimônio cultural, fazendo valer a máxima de que e impossível amar sem conhecer, ou falando a respeito de patrimônio cultural da sua importância. Vejo o blog como uma extensão educacional que se converte em conhecimento para todos alheios ao contato real com estes ou ao menos teórico.Parabens.

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